Os livros fazem a História

As ideias do historiador norte – americano Robert Darnton mostram que é preciso «compreender o livro como uma força da história» e, principalmente, que «os livros não se limitam a relatar a história: eles fazem a história.» O livro seria protagonista de mutações na vida e de transformações da história.



R. Darnton constitui um dos mais importantes historiadores do livro e da leitura de uma época. Na história do livro evidencia a força e o poder do impresso, do publicado, sejam livros ou folhetos, o impacto da canção e das suas redes de comunicação, como o sugeriu em “Poesia e política” (2014). A partir de uma abordagem da história social das ideias, com o intuito de frisar o desempenho dos livros no fazer da história, trouxe novos elementos para o entendimento dos livros como sujeitos do seu próprio tempo, inseridos num processo histórico.

Darnton é professor de História na Universidade de Princeton, autor de inúmeros artigos e obras de grande relevência, tais como: “O grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa”(1986); “Revolução na impressão: a imprensa em França 1775 – 1800” editado com Daniel Roche (1989); “O beijo de Lamourette” (1990); “Boémia literária e revolução” (1987); “Os best-sellers perdidos da França pré – revolucionária” (1998), entre outros.

Pela sua conceção teórico – metodológica a respeito da forma como concebe a história, insere-- se na linha historiográfica que, progressivamente, valoriza os estudos culturais ou perspectiva a cultura também como base analítica. Ao focar o seu trabalho no estudo das mediações culturais ou na maneira como se lida com experiências culturais, potencia a insurgência da abordagem cultural.

R. Darnton situa-se entre a história cultural e a história social, propõe a cultura como um sistema de análise das sociedades e como um processo dinâmico de possibilidades de mutação histórica.

Considerando que a cultura não pode ser separada da íntima conexão com outros níveis de experiência, antes se insere entre outros elementos mais complexos duma sociedade, como os seus símbolos e sistemas de significações, R. Darnton procurou construir uma “história social das ideias”, na forma como as ideias circulam no seio das sociedades, se tornam parte da quotidianidade, abarcando o universo dos interesses sócio - económicos. Assim, as ideias, longe de poderem ser consideradas como pertencentes a uma estratosfera, destacadas das realidades sociais, incorporam-se no húmus social, económico, político. Ao contrário de uma história performativa e puramente intelectual das ideias, tal como a cultura, as ideias inserem -- se no fazer da história e tornam - se potenciadoras de transformações do mundo.


O historiador francês Roger Chartier teve também como permanente preocupação a história do livro, das práticas da escrita e da leitura. (Cf. R. Chartier, A Ordem dos Livros. Brasília: UnB, 1998). O livro, como objeto cultural, para além do seu autor e da sua função de produtor cultural, também gera cultura. Ao ser objeto de leitura, o livro faz germinar práticas criadoras e suscita dinâmicas criativas. Portanto, a prática cultural inerente à produção dum livro publicado ou num outro tipo de texto, a palavra publicada torna-se também prática cultural no ato de acolhimento e no acontecimento da sua receção.

Os livros estão, para R. Chartier, cravados de significações plurais e móveis, construídos na intersecção entre uma proposição e uma receção, no encontro entre as formas e os motivos que lhes deram estrutura e as competências ou expectativas dos públicos que deles se apropriarão. Nas considerações sobre a cultura e, em especial, da tensão dialética entre o poder do livro e a inventividade ou espírito criador do leitor, o livro constitui-se como acontecimento político e social.

Na análise às incidências do livro, ao seu circuito de comunicação e aos impactos que a palavra publicada pode catalisar, outras perguntas centrais se colocam: quem lê? O que se lê? Como se lê? Porque se lê? E as respostas a estas perguntas, para além da contextualização dos livros e dos leitores, contribuirão para entender como ao longo da história os livros, determinados livros, representaram uma ameaça para tantos poderes constituídos.

 E acerca da História, se em termos absolutos não a fizeram, no que poderia supor de exclusão de outros fatores, seguramente, tiveram e continuarão a ter um protagonismo essencial na sua transformação.

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