O sociólogo Pierre Bourdieu publicou,
em 1998, um texto intitulado «Hoje a precariedade está em toda a parte». Nele,
o autor já então perspetivara diversos processos de natureza neoliberal que
implicariam a agudização de impactos sociais devastadores, que agora estão mais
do que confirmados. Ao definir a precariedade como um novo modo de dominação,
Pierre Bourdeu integrava na compreensão daquele fenómeno uma amplitude que
estava muito para lá das áreas laborais, com uma vertiginosa generalização
extensiva a todos os sectores da vida social dos indivíduos. (Cf. P. Bourdieu,
Contrafogos. Oeiras: Celta, 1998.)
O disseminar da precariedade em
larga escala fez com que aquela realidade ganhasse uma dinâmica viral. Essa
capacidade de difusão da precariedade assentou em mecanismos estruturais em
consequência de processos significativos e continuados de desregulação dos
direitos do trabalho, tanto no que se refere às lógicas da contratação laboral,
quer das formas de proteção social.
Muito para além dos programas e
ações políticas que provocaram, e continuam a provocar, a desregulação dos
direitos laborais e a brutal desproteção dos trabalhadores, criaram-se
condições de vida precárias. Dessa instabilidade laboral, nas suas múltiplas e
distintas configurações, resultaram dimensões existenciais débeis e instabilidades
ontológicas. A precariedade impregnou não só o funcionamento das economias,
como afetou a coesão das sociedades.
Com a precariedade
intensificaram-se desigualdades sociais. Emergiram desigualdades de recursos,
nomeadamente, dos rendimentos, da escolaridade, no acesso à saúde e nos apoios
sociais. Realizaram-se desigualdades existenciais, nas formas de reconhecimento
social, nas expressões discriminatórias quanto aos direitos à cidadania plena,
nos direitos a uma vida digna. Geraram-se desigualdades vitais, vidas
precárias, afetando a qualidade de vida, envolvendo a saúde física e mental,
limitando a esperança de vida das populações.
O trabalho precário é um fenómeno
com consequências humanas e sociais devastadoras.
É neste clima de esvaziamento de
aspirações e de expectativas que se realizarão, nos próximos dias, as eleições
para o Parlamento Europeu.
Será possível que os múltiplos
sintomas de mal-estar social que caracterizam vários países da Europa não
tenham reflexo direto nestas eleições para o Parlamento Europeu?
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