O nosso sistema parlamentar dentro daquilo que se
pode ver pelo mundo fora onde se experimentam outras formas de expressão democrática, parece-me ser que é o mais interessante. Claro que nada nos deve
tapar a visão e não ver que ele acarreta problemas e desafios constantes. E perfeito não é nem nunca será.
Porque considero ser o mais interessante? – Porque vejo
que os nossos destinos podem ser governados na base do debate e do diálogo
parlamentar frequentes. Não é um homem só que manda, mas um conjunto representativo
eleito pelo povo. É sempre com imensa pena que se esvazie a diversidade e a
representatividade. Quanto mais abrangente for esse conjunto melhor. Os maiores
partidos predestinados para governar (mandar), não gostam dessa diversidade e
representatividade. Ela não lhes permite o poder absoluto (que eles chamam
eufemisticamente de estabilidade). Para o povo quanto mais diversidade
representativa melhor, porque resultará daí um debate bastante alargado antes chegarem
as melhores soluções para problemas.
Estamos numa fase interessante da nossa vida democrática
na Madeira. Habituados a ser governados por um partido que foi colhendo
consecutivamente maiorias absolutas, agora o mesmo partido recebeu do
eleitorado o mandato para formar governo, mas em minoria parlamentar. É estranho
para alguns que o mesmo partido tenha ganhado tantas vezes. Pois, estes só
sabem da Madeira destes últimos 40 anos.
Mas nós madeirenses porque sabemos o que é a pobreza
e o abandono, não estranhamos. Só quem sabe e passou, compreende o que é ter
que viver sem luz elétrica, sem água potável canalizada, ausência completa de vias de acesso ou
outras infraestruturas básicas, a educação que era só para ricos, o analfabetismo
generalizado, a escravatura do regime da colonia, as famílias desfeitas pela
emigração, o sistema de saúde miserável e tudo aquilo que podemos beneficar
hoje… As mudanças que levaram ao fim desta miséria, gerou um sentimento
coletivos de eterna gratidão para quem foi o rosto da chegada deste progresso.
À conta desta eterna gratidão. Muita maleita se foi
fazendo. Havia as costas largas protegidas pelo eleitorado para fazer tudo que
apetecesse. Mas, esse tempo acabou. As pessoas vão sendo outras, hoje as ideias
estão na cabeça de pessoas diferentes, os jovens não sabem desse passado e vai
caindo no esquecimento a época da viragem e mais ainda quem foram os
protagonistas dessa viragem histórica. Por isso, os resultados eleitorais vão
sendo outros, os propósitos e vontades também mudaram. Daí considerar que
estamos numa outra fase da nossa história democrática que é preciso saber ler,
adaptar-se a ela e corresponder à vontade dos eleitores (do povo em geral).
Esta nova etapa recusa maiorias absolutas, não votou
em coligações e disse que pretende um governo minoritário, que seja capaz de
colocar no centro da governação o diálogo e o debate parlamentar. Aqueles que
sejam os responsáveis pela violação destes sentimentos coletivos, que se preparem,
porque no devido momento terão a resposta em conformidade.
Por isso, eu como cidadão eleitor, que nunca deixou
por mãos alheias a responsabilidade do seu voto, desejo muito que tenhamos uma
legislatura de quatro anos de debate forte e vivo permanentemente. Almejo um
governo, mesmo que minoritário, que vá frenquentemente (até quotidianamente se
necessário à casa da democracia) negociar lei a lei, proposta a proposta, uma
por uma, com os parceiros da direita ou da esquerda. Não importa com quem se
fala e se negoceia em democracia, o mais importante são as soluções quando são
benéficas para toda a população.
Estamos no momento
propício para fazer da famigerada má fama do nosso Parlamento Regional ( quem
não se lembra da «casa de loucos»), o espaço central das nossas vidas, onde o
confronto de ideias se torne o pão nosso de cada dia. Ali se deve escalpelizar
tudo o que diz respeito a todos, sem medos e com total transparência. Esta
vontade que alguns manifestam em querer mais uma maioria a governar-nos (tudo
em nome da estabilidade, dizem) levanta suspeitas e prova o quanto se deseja
estar comodamente no poder, sem atrapalhos e sem desafios. Temo tudo isto, ao
ponto de estar a advinhar, mais cá mais lá, as mesmas políticas, a mesma
distribuição de dinheiros públicos e as mesmas benesses, mesmo o que se
disfarce que vão ser partilhadas por mais um partido.
No fim, vamos ter mais do
mesmo a favor dos mesmos contra a maioria que manifestou desejo de que tudo se
alterasse. Se assim for, previnam-se os responsáveis, porque o povo não é
idiota e sabe pacientemente esperar pelo momento certo para dar a resposta. Viva
a democracia que pretende quebrar o enguiço do absolutismo, as humilhações dos adversários e abrir o caminho onde ninguém fica para traz e conta conto todos, porque todos são expressão do coletivo do eleitorado. Isso é democracia a sério, cujo alicerce é o respeito pela diversidade.
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