Onde impera uma tradição
autoritária e oligárquica, como na Região Autónoma da Madeira, é crucial pensar
uma nova cidadania. A nova cidadania implica mudanças profundas na cultura
política, requer o aprofundamento da democracia, supõe a dinamização da democracia
direta.
Num panorama de cidadania
tutelada, de ordem estrutural, são indispensáveis outros referenciais de
participação política dos cidadãos, muito para além dos projetos com recortes
político-partidários.
Nesta Região fazem falta
movimentos que levem à formação de uma contra cultura, ou seja, de uma cultura
em que se opere uma rutura com a alienação, com a cultura dominante, na qual os
indivíduos desenvolvam passos no sentido de se tornarem sujeitos da sua própria
história.
As ações empreendidas visando
a conquista de direitos, em determinados contextos e períodos históricos,
tantas das vezes, transformaram-se em movimentos, lutas prolongadas, em ações
sociais coletivas, articuladas em frentes de intervenção pública ou
organizações de protesto. Assumiram a forma de expressão de um processo social,
configuraram modalidades de construção da cidadania ativa. Nas conjunturas
sócio- económicas e políticas de cada momento da sociedade, aquelas lutas
geraram inflexões na ordem sociopolítica predominante, criaram ruturas ou
estabeleceram novas relações e co- relações de força, desenvolveram
transformações a partir do confronto poder-povo.
Mas, nem todas as ações
coletivas, nem todos os sujeitos coletivos de conquista de direitos e de
intervenção social ganharam poder de transformação política. Nem todo o tipo de
ação coletiva, enquanto instrumento de pressão política e de mudança na
sociedade, se constituiu em movimento social.
Na
dinâmica progressiva da conceptualização dos movimentos sociais os atores coletivos,
numa conjuntura específica de relações de força na sociedade, definem-se como
uma resistência a uma forma de dominação social contra a qual são invocados
valores, criam-se identidades propondo a contraposição de um outro tipo de
sociedade. De acordo com Alain Touraine, na revisão do conceito de movimentos
sociais promovida pelo próprio, uma ação coletiva de tipo societal é entendida
como portadora de uma identidade, de um adversário e de um projeto, baseando-se
na consciência de um conflito com um adversário social. (Cf. A. Touraine, Poderemos
viver juntos? Petrópolis: Vozes, 2003, p.119).
As dinâmicas da cidadania
ativa só ganharam a natureza de movimentos sociais, para além dos processos
meramente reivindicativos, quando as intervenções públicas e coletivas
suscitaram uma identidade (uma força social mobilizada e movida por um
determinado sentido de pertença), se tornaram oposição (através de uma base de
contraposição a um adversário comum, devidamente objetivado) e formaram uma
totalidade (tendo objetivos sociais alargados, pretendendo efetivar
alternativas e mudar a sociedade). (Cf. A. Touraine, Crítica da Modernidade.
Lisboa: Instituto Piaget, 1994 p.285).
A transformação social,
cultural e política de que a Madeira tanto precisa dependerá da emergência de
movimentos sociais que materializem um novo paradigma de construção social, de
conquista política e de articulação de novos mecanismos de participação cidadã.
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