A escola tem de ser mais do que manuais, sumários
e pormenorizadas grelhas de avaliação, radiografando obsessivamente e encaixotando
a sua diversidade em escalas percentuais. A escola tem de ser fermento de e
para a vida, lugar e oportunidade de paixão e de sonho, de aprendizagem e de
produção de saberes consistentes.
A Escola
… precisa de serenidade e isso não é possível
com posturas centralizadoras ou da peregrina ideia da municipalização;
… necessita de autonomia organizacional e
pedagógica, não de sufocantes políticas padronizadoras;
… precisa de financiamento para que as dívidas
não perturbem a aprendizagem;
… tem de sair dos seus muros convencionais e
projectar-se na vida real, interagindo com todos os outros sistemas,
analisando-os e compreendendo-os com o necessário pensamento crítico;
… não pode ser a mera repetição que prepara
exames, quando os alunos, hoje, se relacionam com o conhecimento de forma
diferente das gerações passadas;
… não precisa de um fato de tamanho único ou de
um velho com arranjos marginais, mas do respeito pela diversidade cultural,
expectativas, potencialidades de cada um, liberdade de escolher e decidir o que
aprender e como aprender;
… não pode ser professores, por um lado,
alunos, por outro, auxiliares que cumprem ordens, pais distantes, antes uma
comunidade em permanente aprendizagem;
… não deve caracterizar-se pela imensidão de
pequenos projectos desarticulados no tempo, antes pela existência de um caminho,
aglutinador e portador de futuro;
… não deve ser conservadora e reprodutora de
modelos sociais, com um currículo e disciplinas desconjuntadas, antes um espaço
de inspiração, criação, inovação, de cultura, de auto-estima e de afectos,
capaz de gerar, paulatinamente, os pressupostos da curiosidade;
… é muito mais que manuais, sumários e
pormenorizadas grelhas de avaliação, com percentagens para tudo, radiografando
e encaixotando obsessivamente a diversidade social entre 0 e 100%, antes uma
instituição de aprendizagem disponível para o conhecimento, produção de saberes
consistentes e fermento de e para a vida;
… não pode ser um local de obrigação, triste, enfadonho,
antes um espaço que apaixone, de prazer pelo estudo, pela descoberta e pelo desejo
que conduz ao conhecimento sustentado;
… não pode caracterizar-se por um sentido
individualista, quando as áreas de intervenção profissional fazem apelo ao sentido
de grupo;
… não pode assentar em exaustivos programas e
duvidosos conteúdos, injectados qual vacina, antes o foco da sua missão deve
centrar-se na observação, experiência, raciocínio, questionamento integrado de
tudo e na mútua descoberta de respostas, não aquelas exigidas em testes de
exclusão, antes as que se alimentam na interrogação, na capacidade de
argumentação e nas soluções criativas;
… não deve (a)fundar-se na burocracia, nos
papéis, muitos papéis que circulam e enervam, uns repetitivos, outros
desnecessários, tarde ou cedo destinados ao arquivo morto, que apenas
justificam os lugares que a hierarquia política ocupa.
Lugar
de paixão e sonho
Ora, criar instituições de aprendizagem, não
estabelecimentos de ensino, dá muito trabalho! Romper com o passado e com as
rotinas da fábrica, assentes na lógica do toca-e-entra-toca-e-sai, é complexo. É
difícil operar uma revolução na aprendizagem, depois de dezenas de anos de
rédea curta, de condicionamento da inovação, com uma classe docente trabalhadora,
porém, envelhecida, cansada e desmotivada. Não é tarefa fácil assumir que aprender
é muito mais do que transmitir conhecimento enciclopédico segmentado e que o
papel do professor deve ser hoje a de mediador e potenciador da descoberta. Mas
é por aí que o caminho deve de ser trilhado, para que o êxito aconteça e baixem
os números do abandono, do insucesso e das qualificações que perturbam o
desenvolvimento.
Há uma frase de Izabel Grispino que me cativa:
"(...) antes de colocar a educação numa vala comum, é recomendável
examinar cada indivíduo, cada anseio, cada desejo embutido na personalidade (...)".
Baseado nessas palavras, à medida que digito, perpassam-me, por aproximação, algumas
imagens que retenho do programa “Got Talent”, onde crianças e jovens mostram as
suas capacidades em um hino à beleza sensorial das múltiplas artes. A estética
em todo o seu esplendor atravessando, de uma ponta à outra, através do corpo, a
música, a dança, o canto, a declamação, a magia, a comédia… No essencial, tudo
quanto a imaginação, a vontade e o sonho podem conduzir. Ora, se tudo aquilo
que nos toca e muitas vezes emociona até às lágrimas é possível, fico a pensar
nas razões da escola não ser, igualmente, para a maioria, um local de paixão e
sonho. A resposta está numa outra visão que conduza a excelentes ambientes de
aprendizagem. Daí que o sistema educativo necessite de uma revolução, nunca de
uma evolução através de acertos marginais.
Ilustração: Google Imagens.
0 comentários:
Enviar um comentário
Pedimos que seja educado e responsável no seu comentário. Está sujeito a moderação.